Vamos pensar um pouco, hoje, portanto, sobre música e psicanálise. Tigresa, do Caetano Veloso, sempre me fez pensar sobre o feminino. Afinal, Freud, mesmo, declarou em certo momento: “eu estudo a psiquê humana há mais de 30 anos e até hoje não sei o que querem as mulheres”.
Mas talvez quem nos dê uma dica preciosa seja Lacan, que nas suas fórmulas da sexuação nos diz que a mulher é não toda. Parece que ele diz assim: O gozo masculino é todo referido ao falo. Já o gozo feminino é não-todo fálico. E isso nos leva, segundo o seu esquema e formulações, a que os homens, ao final, são todos “meio parecidos” e as mulheres seriam “cada uma”, “únicas” de fato.
Ana Laura Prates nos lembra em seu livro de meados dos anos 90 “Feminilidade e Experiência Psicanalítica” sobre outro livro, de Camille Paglia – este, Personas Sexuais -, que conseguiu produzir bastante em torno da ideia do feminino e dos mitos que historicamente estiveram associados à mulher.
Desde a imagem relacionada ao poder de dar origem à vida, passando pelo mito grego das moiras que além de nascimento controlavam também a vida e a morte de homens e deuses e recordando do temor a um suposto saber hermético associado ao feminino – seriam as bruxas e feiticeiras da idade média.
Ou ainda ao relacionamento das alternâncias de humor ou personalidade associados a forças da natureza – fases da lua ou propriedades do próprio útero – hystheros, e daí a histeria. Ou seja, seres “pouco controláveis”, que escapariam ao racional.
De qualquer forma, ainda vemos isso tudo fascinando ou assustando alguns pobres homens que se veem às voltas com a sua própria feminilidade mal resolvida e, por isso mesmo, tendo que ser intensamente reprimida. Mas quando isso ocorre, muitas vezes a reação a essa repressão não fica restrita ao seu próprio imaginário. Infelizmente a reação ocorre contra o concreto que ele vê no mundo, ou seja, atacando o seu feminino inconciliável nas próprias mulheres. E eis que temos aí a misoginia em todo o seu espectro possível, do mero desrespeito e pouca consideração até o extremo hediondo dos feminicídios.
Lembrando sempre que aqui, nesta reflexão sobre Música e Psicanálise, estamos falando de todas as mulheres – qualquer que seja o corpo que estiverem habitando.