Autoimagem: a ponta do iceberg?

autoimagem a ponta do iceberg

Conversando recentemente com a amiga Thaisa Melara, consultora de imagem, sobre a sua experiência profissional acabamos desenvolvendo uma reflexão sobre a importância e impacto da experiência da consultoria em imagem tanto para cliente quanto para ela mesma.

Afinal, para seus clientes (geralmente suas clientes) a demanda parte de uma inadequação, um incômodo ou uma insatisfação com a maneira como se apresenta ao mundo que, às vezes, não é pouca coisa – por isso a relação com a expressão ponta do iceberg. Temos nesse momento uma pessoa falando de sua vida, de como se vê, de como acha que é vista e que não está feliz com isso. Histórias de anos de dúvidas e inseguranças e até ansiedades encontram ouvidos e olhos atentos para ajudar a aproximar-se de uma imagem idealizada ou criar uma nova, que estabelece relações inauditas com padrões ou lembranças de referência em sua história que responderão – tomara! – à pergunta: “estou bem?”.

Essa pergunta, aparentemente inocente, esconde um desejo geralmente complexo e amplo de corresponder a uma expectativa, de agradar um “outro” não muito bem localizado ou definido, mas que muitas vezes age com censura ou reprovação impressionantemente intensos. A tristeza e a decepção associados a não poder responder à pergunta “estou bem?” incidem com intensidade desproporcional e não é raro sabermos de pessoas que, após uma sessão de até horas de duração de provas de roupas antes de sair de casa para um evento social, estão praticamente destruídas emocionalmente, com uma sensação clara de desamparo ou próximas da angústia e, entre lágrimas e soluços, informam por mensagem que não poderão comparecer no evento por uma súbita indisposição de saúde. Em resumo, a sua autoimagem revela-se insustentável nesse momento e, a partir disso, nada mais lhe será possível enfrentar.

Apenas para ampliar um pouco a reflexão sobre autoimagem, temos este artigo que nos fala sobre o autodenominado “Ken Humano”, homem que promoveu várias modificações cirúrgicas em seu rosto para ficar o mais parecido possível com o boneco de brinquedo, par da boneca Barbie. O quanto podemos pensar sobre este ideal, não é mesmo? E, se formos nos atentar a outros fenômenos relacionados à distorção da autoimagem podemos discorrer não por parágrafos, mas por livros e livros que analisam a importância dessa questão na vida social da nossa espécie: expressões culturais no mínimo inusitadas como os conhecidos pés encolhidos à força das moças chinesas – os chamados pés de lótus –  até mutilações rituais em populações indígenas e pescoços alongados das mulheres tailandesas. Nesses contextos específicos, a busca da autoimagem ideal passaria, portanto, por processos de grande sofrimento físico para que a tão buscada correspondência a um ideal fosse alcançada.

Vemos então o quanto as pessoas estão dispostas a conceder para que a pergunta “estou bem?” seja respondida positivamente. E é nessa dinâmica que se situa o trabalho da amiga Thaisa, que busca dar resposta e contexto profissionais para a pergunta central desta reflexão. Mas também comentou comigo o quanto está atenta a fenômenos mais profundos e limitantes associados às percepções e relatos de sua clientela, momentos em que percebe que a pergunta, na realidade, é apenas a ponta do iceberg que acoberta outras perguntas e questões mais fundamentais. Para casos em que afetos muito intensos estejam associados à questão da autoimagem ficou a sugestão e a lembrança de que a psicanálise pode ser um caminho para ressignificar essa busca de um ideal por vezes deslocada, exagerada ou irreal.

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