O preconceito com a psicoterapia

“Isso é coisa pra louco ou pra gente fraca, que não consegue resolver seus próprios problemas” ou “Não é pra tanto… Isso passa” ou ainda (mais comum entre homens) “Êêê… Esse negócio de terapia é mais coisa de mulher, meu chapa”, pra sermos brandos nos termos utilizados neste texto ao exemplificarmos dizeres comuns em relação à psicoterapia e seus efeitos. Pois o que queremos é demonstrar a grande resistência e preconceito que ainda persistem em relação a iniciar um processo terapêutico, seja ele qual for. E por que será?

Queremos compartilhar aqui a visão de que há, para iniciar um processo de trabalhar um sofrimento ou uma inconsistência do ser, uma espécie de “sequência”:

  1. Sofrimento difuso: algo acontece e eu não percebo exatamente o que é. Tento amenizar o efeito da ansiedade; acho que a depressão é algo passageiro ou parte da minha personalidade; escondo a impotência; relaciono a frigidez uma indisposição do dia-a-dia; ataques de fúria são da minha índole; minha inibição para quase tudo é coisa minha…
  2. Sofrimento nominado: assumo que há algo errado, que limita a minha vida no trabalho, nas relações sociais ou no amor. Sei que sofro e que minha vida está sendo afetada. Talvez não saiba ainda direito o que fazer, mas trata-se de um ponto marcante porque não há mais como minimizar os efeitos do que ocorre comigo. E neste ponto, em geral, já houve prejuízos perceptíveis com a vida social ou laboral.
  3. A busca da solução: o sofrimento que um dia foi minimizado ou escamoteado agora é insuportável e a decisão de buscar ajuda está tomada. Afinal, algo em mim precisa mudar.

Com isso queremos demonstrar que no início da “sequência” o sujeito está resistente a aceitar que algo em si está errado, pois é muito difícil reconhecer que há realmente um problema, e que esse problema é meu. Enquanto o problema está difuso pode ser atribuído ao outro, ao mundo, às circunstâncias da vida, mas quando está nominado – sofro de …. – não há como responsabilizar o que está fora e a atenção do sujeito volta-se para si, para dentro, com um sentimento de decepção e de vergonha, às vezes. E aí é que está o “segredo” de se conseguir avançar da etapa 1 para a etapa 2: diferentemente do que se possa pensar, é na humildade de assumir a nominação de seu problema que reside a coragem – e não a fragilidade – do sujeito. Afinal, manter-se na posição de negação que sustenta o sofrimento – seu e dos outros – indica um apego compatível com a imaturidade das crianças amedrontadas com o desconhecido e com o novo. A modificação de 1 para 2 implica em uma perda da imagem ideal (narcisismo), em um assumir-se “errado” ou “incompleto” ou “insuficiente” e isso, convenhamos, não é pra qualquer um.

Portanto, fica aqui a reflexão sobre a nossa prática em psicanálise que enumeraria diversas histórias de coragem, de redisposição do sujeito em relação a si mesmo e aos outros, e que só nos traz a impressão de uma grande coragem, e coragem dupla, pois foram capazes de sobrepujar o preconceito com a psicoterapia e a dificuldade intrínseca de assumirem-se incompletos – como todos somos – para si mesmos E para os outros à sua volta, que ainda insistem em sustentar fantasiosas auto-imagens “plenas”, “suficientes”, “autônomas”, “capazes”…

E fica subentendido aqui entre nós que, para a etapa 3, podemos ser uma alternativa.

glaucopsicanalise
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Um comentário

  1. Vanessa Rodrigues

    Belo texto!!! 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻

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