Ira: o “pecado” mais comum

Hass oder eine Art Hamburger Hill

Talvez o mais comum e frequente dos “pecados”, a ira vem sendo tratada e mencionada como um problema moral ou de caráter desde há muito por Sêneca (séc I), Evagrius do Ponto (séc IV) e São Tomás de Aquino (séc XIII), entre muitos outros, posto que a sua manifestação, em geral, inviabiliza o convívio social razoável. Diz-se da pessoa que manifesta episódios frequentes de ira ser irascível ou iracundo – termos menos utilizados hoje em dia – mas mais comumente conhecidos por terem ataques de raiva ou de ódio dirigidos a alguma coisa, fato ou alguém. Em geral, uma reação de descontrole desproporcional ou exagerada que provoca ou quer provocar o medo e o temor, pois a manifestação é de agredir, anular ou destruir súbita e violentamente o objeto da ira.

Afinal, quem nunca teve um momento em que “perdeu a paciência” em que dirigiu palavras duras e destemperadas, com desejos de destruição em relação àquilo que o tenha contrariado ou frustrado? Sim, são episódios de ira do dia-a-dia que uma vez ou outra acabam surpreendendo o mais bem resolvido dos cidadãos. Mas estamos falando é daquele sujeito que podemos caracterizar como o irascível, o esquentado, o pavio-curto: para este tipo de pessoa, a frequência com que vem a “perder a paciência” é característica conhecida e compartilhada pelos de seu círculo de convivência. E aqui vai um ponto de atenção: é um modo de funcionamento tão primevo – ou infantil, se preferirmos – que produz reações diversas dependendo do físico ou posição social do sujeito irascível. Sim, pois uma situação é conviver com uma criança irascível, que se mostra agressiva ou de difícil convivência; outra é com um adulto irascível, cujos ataques podem produzir lesões físicas graves em seus “oponentes”. Ou seja, no momento de um ataque de ira ou raiva, o sujeito está aquém da sua capacidade de simbolizar ou negociar sobre aquilo que o afeta e reage como que em legítima defesa – como atestam, por exemplo, os agressores de mulheres, por exemplo, relatando que não viram outra alternativa no momento das agressões, pois sentiram-se provocados em seu âmago.

Novamente, portanto, cremos que estamos falando de uma estrutura com falhas narcísicas importantes na medida em que o que afeta o irascível é da ordem do certo/errado, da expectativa não cumprida, do vencer/perder, da frustração – fatos da vida que arremessam o sujeito para uma posição que não foi suficientemente simbolizada e, por isso, não permite ao sujeito acessar recursos linguísticos que o ajudem a contornar a situação. Nessa posição frágil, sua única defesa é, como já mencionamos, avançar furiosamente contra aquilo que ameaça (imaginariamente) desconstituí-lo. Exatamente como faria uma criança de tenra idade contra outra que lhe tenha frustrado uma brincadeira, por exemplo. A dinâmica é, portanto, tão infantil que chegamos a caracterizar um adolescente irascível de porte físico modesto como “o esquentadinho da turma”, em tom meramente jocoso; mas dizemos de um adulto em posição de poder que tem “personalidade forte”, pois é difícil brincar com o seu poder de explosão.

Fica a nossa indicação terapêutica para os irascíveis ou iracundos que se revelam um tipo muito frequente na sociedade quando se fecham em opiniões inflexíveis, em dogmas, em crenças que quando questionados reagem com uma explosões de ira, sendo essa a principal manifestação desse “pecado”: um surto de fúria, de descontrole que pode resultar em violência física com frequência cada vez mais preocupante. Muitas vezes, o irascível não admite seu sofrimento, pois, mesmo sentindo a culpa resultante do seu ataque de raiva, procura dar sentido e justificar-se como tendo sido levado a esse extremo pelo outro. Afinal, como se diz popularmente, “a culpa é minha; e eu a coloco em quem eu quiser”.

Um comentário

  1. Vanessa Rodrigues

    👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻

  2. Alexandre Varella

    análise interessante

  3. Joao Alberto

    Eu, insfelizmente, confesso, que tenho crises enormes de ira. Preciso ir à emergência. Me sinto um idiota, por tal comportamente. Sou um neurotico histérico muito grave.

    1. Glauco Machado

      Oi, Joao Alberto
      E você já está em terapia?
      Caso ache interessante, podemos conversar por telefone.
      att
      Glauco Machado
      41 99205 2334

  4. Juliano Barreto

    👏👏👏 Muito bom.

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