Recentemente acabei ouvindo duas histórias de homens já com mais de cinquenta anos que me chamaram a atenção. Ambos construíram carreiras de relativo sucesso em suas áreas mas colecionavam eventos de interação problemática com seus pares, subordinados e líderes. Acabaram sendo demitidos uma, duas, três vezes em ocupações dentro de seu campo de atuação e chegaram ao ponto de estarem desempregados com mais de cinquenta anos, com uma rede de contatos fraca, separados de suas famílias e um histórico de convivência inviável – cenários comuns a narcísicos, pessoas conhecidas por personalidade forte, portanto.
Mas, ainda assim, de seus pontos de vista, o “mundo é injusto” ou “as pessoas não os entenderam direito” ou outra justificativa externa. Demarco: EXTERNA porque os irresponsabiliza em suas histórias atribuindo a um outro o insucesso em suas vidas. Exploramos um pouco a respeito neste vídeo.
Infelizmente, este tipo de história é muito mais comum do que se possa imaginar e começa a ser escrita bem mais cedo. O caráter narcísico reúne uma série de características possíveis, mas podemos resumir descuidadamente em uma incapacidade do sujeito de envolver ou considerar os interesses de quem o cerca e prevalece apenas a sua opinião ou a impressão. Quando confrontado reage intensamente (ou violentamente) e não busca o acordo ou o meio-termo. Têm dificuldade em aceitar erros e não raro distorcem regras e contratos para que a sua “verdade” se efetive. Muitas vezes os narcísicos são caracterizados como pessoas com personalidade forte ou (apenas) teimosas, mas o que está atuando, no fundo, é uma estrutura que inviabiliza o trânsito de ideias e que revela uma fragilidade patente disfarçada em força de opinião.
São pessoas que, por “estarem sempre certas”, quase nunca se questionam e, portanto, raramente buscam ajuda terapêutica, pois não se reconhecem como problemáticas – afinal, o problema é sempre o outro. Assim, acabam gerando NOS OUTROS conflitos que os levam – esses, sim – a buscar ajuda, principalmente se temos um narcísico ocupando uma posição de poder. Apontar este tipo de conduta, falar sobre o quanto isso é deletério para a vida do sujeito, revelar o caráter mortífero dessa dinâmica são caminhos para que se evitem desenlaces como os que abrem este texto. E fica a torcida para que, mais cedo, enquanto ainda é tempo, busquem questionar-se com a ajuda, eventualmente, da psicanálise.